Esta é uma pergunta que tem como resposta o valor de uma casa, de um apartamento, de um sítio, de uma chácara, de uma fazenda, etc. Não é exagero, uma vez conhecedor desta resposta você terá a plena capacidade de salvaguardar o seu negócio e deixar de correr riscos desnecessários, saltando na frente daqueles que desconhecem este assunto.
Em várias ocasiões já falei sobre os inúmeros riscos que envolvem uma transação imobiliária, da mesma forma que em momentos anteriores já deixei várias dicas de como ao menos diminuir os impactos destes problemas no seu negócio.
Hoje não poderia ser diferente, estou aqui mais uma vez para te dar uma dica valiosa sobre um dos negócios mais comuns no Brasil, a promessa de venda e compra.
Poucos sabem, mas é de suma importância registrar a promessa de compra e venda na matricula do imóvel, como forma de garantir a segurança da transação, especialmente para o promitente comprador.
Você verá ao longo do presente artigo que quando se deixa de lado uma medida tão simples como esta, paira sobre o negócio uma série de possibilidades que colocam em xeque a segurança do comprador.
E é por isso que quero falar um pouco sobre este assunto para mais uma vez abrir seus olhos e te ajudar a não se meter em um problema de difícil resolução posterior, mas para isso, preciso esclarecer, ainda que sucintamente, alguns conceitos e institutos jurídicos que afetam diretamente a importância deste registro.
DOS BREVES APONTAMENTOS SOBRE A PROMESSA DE COMPRA E VENDA
A promessa de compra e venda ou compromisso de compra e venda, como queiram, é o negócio jurídico pelo qual alguém promete vender e outro promete comprar determinado bem imóvel, mediante contraprestação à curto, médio ou longo prazo.
Pontes de Miranda, em sua absoluta sabedoria conceituava a promessa de compra e venda como sendo “o contrato pelo qual as partes se obrigam a concluir outro negócio, sendo essencial à noção do pré-contrato que se obrigue alguém a concluir contrato ou outro negócio jurídico”. (Francisco Cavalcanti Pontes de Miranda, Tratado de Direito Privado, 4ª ed., São Paulo, 1977, t. XIII, p. 30.)
Trata-se na verdade de um passo anterior à compra e venda propriamente dita, objetivando a transferência de determinado bem à satisfação de condição futura. Por exemplo, é comum encontrarmos pessoas que só conseguem pagar o valor solicitado pelo vendedor de forma parcelada, então sendo assim, o vendedor promete vender, leia-se transferir o bem, depois de receber o preço de todas as parcelas.
Pois bem, uma das questões que envolvem este tipo de negócio é a inexistência de vínculo, a princípio, do comprador com o bem comprado. Veja, a mera promessa de compra e venda não cria nenhum vínculo real entre quem paga o preço e o bem prometido a venda, mas apenas um direito pessoal/obrigacional entre os contratantes.
Diferentemente, caso a promessa de compra e venda seja registrada na matricula do imóvel, o vínculo real ganha vida, gerando entre o promitente comprador e o bem prometido uma relação patrimonial.
Logo, o registro da promessa na matricula é o verdadeiro divisor de águas neste sentido, na medida em que a promessa registrada faz direito real e promessa não registrada faz apenas direito pessoal/obrigacional
DAS DIFERENÇAS ENTRE OS DIREITOS REAIS E OS DIREITOS PESSOAIS
Direito pessoal é aquele que provém de uma relação entre dois sujeitos de direito que possuem personalidade jurídica própria, tornando um deles “devedor” e o outro “credor” de determinado direito.
Por exemplo, quando alguém contrata uma prestação de serviços mediante contraprestação, o contratante torna-se credor do serviço contratado e devedor do preço ajustado, enquanto que o prestador torna-se credor do preço ajustado e devedor do serviço contratado, existindo entre ambos, direitos pessoais/obrigacionais.
Trazendo este instituto para nosso mundo imobiliário, quando as partes negociam imóveis por intermédio de serviços de corretagem, por exemplo, existe entre elas e o corretor um direito pessoal, consubstanciado no pagamento da comissão de corretagem e no serviço de intermediação.
Note-se, portanto, que em nenhum dos exemplos acima descritos há um vínculo entre alguém e uma coisa, mas apenas entre alguém com outro alguém.
Diferente do que ocorre com os direitos reais.
Os direitos reais são vínculos jurídicos entre um sujeito de direito e uma coisa. Refere-se, na verdade, a direitos estritamente patrimoniais, cujos quais conferem à alguém determinado poder sobre determinada coisa.
Muito há que se diferenciar entre um e outro, a começar pelo seu regime no âmbito do código civil. O Código Civil estrutura as matérias de maneiras distintas, até porque os direitos pessoais são ilimitados e passíveis de novas criações cotidianamente, uma vez que não existem barreiras para as inovações do homem, diversamente dos direitos reais, que são limitados ao rol taxativo do art. 1.225 do Código Civil.
Neste aspecto o legislador criou mecanismo simples para diferenciar uma coisa da outra, ao passo que só será direito real se o direito em questão estiver elencado no art. 1.255 do Código Civil, impreterivelmente.
Duas peculiaridades conferidas aos direitos reais são a publicidade e oposição erga omnes, o que em outras palavras significa dizer que é oponível contra tudo e contra todos.
Então, exemplificando, quando alguém é proprietário (direito real), tem o poder de usar, gozar, fruir, reaver e dispor daquele determinado imóvel, em detrimento de todas as outras pessoas, justamente por ser um direito real oponível erga omnes.
Postos tais esclarecimentos, agora você entenderá a importância do registro da promessa de compra e venda na matrícula do imóvel.
A IMPORTÂNCIA DE REGISTRAR A PROMESSA DE COMPRA E VENDA NA MATRICULA DO IMÓVEL
O registro da promessa de compra e venda na matricula não é mero enfeite criado pelo legislador para burocratizar as negociações, fiscalizar as relações privadas, ou arrecadar proventos aos cofres públicos.
Quando a promessa de compra e venda é registrada na matricula, a relação deixa de ser meramente pessoal e assume caráter real, sendo pública e oponível erga omnes, contra absolutamente todas as pessoas.
O decreto-lei nº 58/37 responsável por regular as promessas de compra e venda na vigência do omisso Código Civil de 1916, trazia em seu art. 5º:
Art. 5º A averbação atribui ao compromissário direito real oponível a terceiros, quanto à alienação ou oneração posterior far-se-á à vista do instrumento de compromisso de venda, em que o oficial lançará a nota indicativa do livro, página e data do assentamento.
Posteriormente, na década de 70, o legislador ao promulgar a lei de parcelamento do solo (lei 6.766/79) trouxe a mesma ideia de transformar a relação compromissória em um direito real, capaz de vincular os contratantes ao objeto do contrato e proteger, sobretudo, os compromissários compradores adquirentes de lotes, veja-se:
Art. 25. São irretratáveis os compromissos de compra e venda, cessões e promessas de cessão, os que atribuam direito a adjudicação compulsória e, estando registrados, confiram direito real oponível a terceiros.
E finalmente com o Código Civil de 2002, o legislador incluiu os artigos 1.417 e 1.418, com as seguintes redações:
Art. 1.417. Mediante promessa de compra e venda, em que se não pactuou arrependimento, celebrada por instrumento público ou particular, e registrada no Cartório de Registro de Imóveis, adquire o promitente comprador direito real à aquisição do imóvel.
Art. 1.418. O promitente comprador, titular de direito real, pode exigir do promitente vendedor, ou de terceiros, a quem os direitos destes forem cedidos, a outorga da escritura definitiva de compra e venda conforme o disposto no instrumento preliminar; e, se houver recusa, requerer ao juiz a adjudicação do imóvel.
Logo, o registro aparece como condição sine qua non para a caracterização da promessa de compra e venda como direito real.
DOS EFEITOS PRÁTICOS DO REGISTRO
E se você não consegue ainda visualizar os efeitos práticos deste registro, permita-me demonstrar para você algumas situações que o registro pode salvar sua vida:
a) Celebração de mais de uma promessa de compra e venda: Imagine que você adquira um imóvel por meio de instrumento particular de compromisso de compra e venda e não o registre na matricula, de modo que espertamente o promitente vendedor decide celebrar a mesma promessa com uma terceira, com uma quarta, com uma quinta pessoa.
Bem, a questão seria resolvida em perdas e danos, conferindo ao promitente comprador, em concorrência com os demais, um direito pessoal de tentar reaver os prejuízos em face da figura do promitente vendedor, através de indenização a ser perseguida por meio de contrições no patrimônio deste último.
Mas e se a promessa estivesse registrada? Ora, então haveria um direito real do promitente comprador em relação ao imóvel, na medida em que uma vez quitada, o promitente vendedor teria a obrigação de outorgar a escritura definitiva ao promitente comprador, restando aos demais o mero direito pessoal de resolver a situação com perdas e danos.
Nesse caso, ainda pouco importará a ordem de celebração das promessas, levando-se apenas em consideração quem efetivamente procedeu o registro na matrícula, como tem entendido o Tribunal de Justiça de São Paulo.
Nesse sentido, destaco aresto da 07ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo que versa exatamente sobre tal situação, note-se:
COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA Venda do mesmo imóvel para pessoas distintas Registro da escritura pelo segundo comprador – Pretensão de tornar nulo o ato Inadmissibilidade – Terceiro de boa-fé que tomou todas as precauções em proteção ao seu direito Vício do registro inocorrente Anulação inadmissível Sentença incensurável Recurso desprovido. (TJ-SP – APL: 00060063420108260079 SP 0006006-34.2010.8.26.0079, Relator: Miguel Brandi, Data de Julgamento: 04/05/2015, 7ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 17/06/2015)
Assim, há a prevalência de um direito real devidamente constituído sobre um direito pessoal/obrigacional.
O fato é que quando se registra a promessa de compra e venda, o promitente comprador impede que o promitente vendedor utilize destas atitudes criminosas para vender o mesmo bem para inúmeras pessoas.
b) Outorga da escritura definitiva para estranho a promessa de compra e venda: Outro cenário possível é a outorga da escritura definitiva pelo promitente vendedor à terceira pessoa que nada tem a ver com a promessa de compra e venda.
Tanto o Cartório de Títulos quanto o Cartório de Registro de Imóveis não se oporão a lavratura da escritura e posterior registro, respectivamente, se não houver na matricula daquele bem o registro da promessa e compra e venda.
Isso significa que se você se compromete a comprar determinado bem imóvel, mas não registra o negócio na matricula, você não terá nenhuma segurança cartorária no sentido de que os registradores não farão o registro de uma escritura de venda e compra em favor de um terceiro estranho.
Isso porque, a promessa de compra e venda celebrada não tem publicidade, de modo que não haveria mesmo como o Cartório ter ciência da sua existência.
Logo, a única forma de se resguardar quando da celebração de negócios desta natureza é realizando o competente registro no CRI da circunscrição da comarca do imóvel.
Ainda mais porque, os custos restringem-se aos emolumentos cartorários, não havendo que se falar em incidência de ITBI neste momento, vez que não consumado seu fato gerador.
CONCLUSÃO:
Por todo o apresentado, bem se nota que o legislador pretende conferir caráter real às promessas registradas para assegurar maior segurança jurídica aos promitentes compradores.
O registro dá publicidade ao ato, impedindo que alguém seja enganado a se comprometer a comprar imóvel já prometido à venda para uma terceira pessoa.
Da mesma forma, garante ao promitente comprador o vínculo real com o bem prometido à venda, podendo ao final exigir do promitente vendedor a outorga da escritura definitiva à todo custo, se socorrendo ainda do Poder Judiciário por meio de ação de adjudicação compulsória, se o caso.
Enfim, registrar a promessa de compra e venda não é tarefa complexa que exige enorme esforço psicológico, resumindo-se basicamente em um requerimento no cartório e o pagamento de emolumentos.
Mas não se engane, sua simplicidade não diminui a sua importância como você já viu aqui neste artigo, sendo capaz de inclusive, salvar uma boa parte do seu patrimônio.
Assim, guarde estas dicas e não deixe de registrar sua promessa.
Espero ter te ajudado, grande abraço do seu amigo, Dr. Leonardo.